quinta-feira, 5 de maio de 2011

Era sexta feira a noite


de repente meu celular toca. Um alívio instantâneo veio quando vi que ele estava apenas no vibrador. Saí da sala de palestras tentando não ser percebida e atendi meu celular, era meu pai perguntando se eu já estava indo embora e com quem. Disse toda confiante que meu amigo me levaria e que estava indo. Liguei para meu amigo e depois de um certo tempo uma voz abafada atendeu: "eu já estou em casa!". Naquele momento meu ar acabou .. como eu ia embora? Como ele fez isso comigo, ele tinha prometido me levar! Então ele completou: "o Julinho vai te levar, boa noite!"
Julinho
? Que diabos de Julinho é esse, eu nem conheço oO'
Minha mente vagava num mar de dúvidas e desespero.
Depois do lanche, um garoto estranho apareceu e perguntou se eu queria ir embora, logo deduzi que ele fosse o Julinho; e ele estava acompanhado de um amigo. Eu ia embora sozinha com dois homens desconhecidos? Não isso não ia acontecer...
Rapidamente, entrei no quarto das meninas, peguei minha mala e fiz uma breve oração pedindo a virgem Maria que não fosse morta ou estuprada no caminho. Quando cheguei do lado de fora da casa, o outro homem já estava no volante e o Julinho pediu para que eu fosse no banco da frente. Eu estremeci, e de uma forma relutante entrei no carro, fechei a porta e coloquei a mala no meu colo, apertando-a contra meu corpo como se fosse um escudo. Aquilo não estava acontecendo .. não podia estar! Eu sozinha em um carro com dois desconhecidos... Meus pensamentos foram cortados quando um som muito alto (o mais alto que já escutei) foi ligado. Eu encostei a cabeça no banco e comecei a fazer uma oração a Nossa Senhora, mas não consegui. A música alta fazia doer minha garganta, o meu nariz; era como se aquele som infernal entrasse no meu corpo e pressionasse meus órgãos internos. Quando então o moço do banco de trás gritou pro motorista abaixar o som: "
ela está com dor de cabeça cara!". Eu não me lembrava de ter dito que estava com dor de cabeça, mas graças a Deus o som foi abaixado e no meu pensamento eu só agradecia por isso. Minhas pernas tremiam e eu não sabia porque, no vidro do carro aparecia uma garota morena com os olhos assustados, aquela era eu. Uma voz tentava acalmar meu coração dizendo: "calma, eles são amigos do seu amigo, nada vai acontecer.." mas logo vinha outra voz: "Amigo? Amigo que é amigo, não deixa a amiga sozinha, tarde da noite com dois homens que ela nunca viu!". Eu me sentia um encosto, um pedra no sapato de todos.
Então o motorista mudou de música, colocou numa pasta de músicas gospel e aos poucos fui ficando mais tranquila; mas a cada caminho estranho que ele passava meu coração ainda estremecia e eu voltava apertar a mala. Quando cheguei na porta da minha casa e coloquei o pé para fora do carro, um alívio momentâneo me abraçou. Eu agradeci aos meus "novos amigos" e entrei.
O alívio acabou quando a gritaria começou ... olhos esbanjando lágrimas, uma TV de plasma molhada, um pai desesperado, uma mãe extremamente magoada, um celular quebrado. Tudo foi tão rápido, mas ao mesmo tempo eu achei que nunca ia acabar. Me perguntaram com quem eu havia voltado e eu menti, mais uma vez, para acobertar um erro que não era meu.
Um turbilhão de pensamentos passavam na minha cabeça; derrota, fracasso, dor, solidão... porque tudo isso estava acontecendo comigo, justo naquele dia? Quando dei por mim estava sentada no chão do banheiro frio, abraçando minhas pernas e chorando loucamente; ali era o ápice da minha fraqueza, há muito tempo eu não me via sentada naquele cantinho frio de azulejos azuis. O silêncio foi cortado quando meu celular vibrou, era um número desconhecido
, hesitei em atendê-lo, mas atendi. Achei que fosse uma colega de quarto, mas logo reconheci a voz da coordenadora do retiro em que estava, sua voz era uma mistura de desespero e nervosismo .. "Nayara, o que te deu pra ir embora e não avisar ninguém?" sai tão desesperada que esqueci de avisar alguém "Você conhece os moços que te levaram em casa?" eu queria responder mais um silencio foi tudo que consegui dizer; então eu pensei nos moços, eles devem ter ficado em maus-lençóis afinal era proibido sair do retiro, muito mais a noite e sem avisar. Eles não tinham culpa, estavam apenas cumprindo o pedido de um amigo. "Você é louca de ir embora sozinha, sem avisar ninguém e com dois homens que nunca viu?? E se acontecesse alguma coisa?? Você está na nossa responsabilidade..." não ouvi o resto da frase, só sei que lágrimas quentes e silenciosas corriam pelo meu rosto; ela tinha razão, ela tinha toda razão mas a culpa não foi minha! Por fim, eu consegui murmurar um boa noite quando ela terminou.

Meus pensamentos agora cheios de vergonha, me ordenavam nunca mais voltar lá. Minha vida virou em menos de 12h, e mais uma vez eu havia perdido tudo que tinha.
A noite acabou com mais algumas lágrimas e uma forte certeza:
Amigos não existem !

Naay Moura